sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Uma Pedra Perfura Um Rio


Uma pedra perfura um rio
Jogada por uma menina, que sorria

A menina acredita que o rio sentiu a pedra jogada por ela
Que a pedra viveu intensamente o voo e se assustou quando se chocou com o rio
Que o grão de areia no fundo do rio arregalou o olhar, pela ameaça da pedra que caia
Que dois peixes fugiram agilmente da pedra, antes de ela atingir a areia no fundo do rio
Que a pedra maior que ficou à margem do rio agora sente a falta da pedra pequena que ela, menina, lançou ao rio
Que a areia onde estava pousada a pequena pedra lançada por ela agora expõe um vazio entre outras pedras
Que a ave que assistiu ao lançamento da pedra pensou que esta voava em sua direção e se aliviou quando a viu cair no rio
Que a mesma ave que pensou que a pedra voasse até ela voou também, com medo de que outra pedra fosse atirada pela menina, desta vez contra si
Que o ar por onde passou a pedra tentou fazer com que ela voltasse ao seu lugar à margem do rio, porém não foi páreo à sua monstruosa força de menina

A menina que jogou a pedra ao rio pensou tais coisas e sorriu, por saber que são mentirosas as coisas que ela costuma imaginar
Porque é a sua dor que constrói o modo com que ela percebe as coisas e, afinal, ela é apenas uma menina que lançou uma pedra ao rio
Ainda que ela fosse a pedra, a ave, o peixe, o grão de areia, o ar ou o rio, tudo o mais dependeria do modo como ela sentisse a vida e a morte das coisas e dela mesma
Porque, afinal, ela é apenas uma coisa que morre e tem medo, tal como a pedra, o peixe, a ave, o grão de areia, o ar e o rio

Ainda que isto seja verdade
Ainda que isto seja mentira

Uma menina à margem do rio
Apedreja a vida, que sorri.