Em
2010, em Salvador, eu dormia enquanto um apartamento no andar acima do
meu se incendiava e os demais moradores do prédio corriam em polvorosa a
meio da noite, com medo do fogo e da fumaça, que poderiam se alastrar e
colocar suas vidas em risco... Aliás, nossas vidas. Mas eu dormia e,
dormindo, corri risco de morrer, foi o que me disse o síndico no dia
seguinte.
Na madrugada da
última sexta-feira, uma terrível tempestade de vento assolou Lisboa. Eu
vivo num sótão, aqui chamado de águas furtadas, de modo que meu telhado é
o mais vulnerável a ventanias e tempestades. É aconselhável que se
abandone lugares assim, quando os ventos estão fortes, pois não se sabe o
que pode ocorrer ao telhado. Eu, no entanto, dormia e nada vi ou ouvi.
Não penso ter anteontem, como em Salvador, corrido algum risco, porém
confirmei que o sono é meu refúgio mais inviolável e, talvez por isso
mesmo, por ser um refúgio tão querido e confortável, ele seja também a casa
de minha morte.